A morte de Ivan Ilitch
Autor: Lev Tolstói
Tradução: Boris Schnaiderman
Editora: 34
Páginas: 96
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Não vou fazer cerimônia: A morte de Ivan Ilitch é um livro sensacional e Tolstói é um gênio. Pouquíssimos escritores seriam capazes de contar a história de um funcionário público bem comum, destacando, principalmente, a longa agonia que precedeu a sua morte, e transformar essa narrativa numa obra-prima da literatura mundial.
Simples, comum e terrível
Ivan Ilitch já está morto no primeiro capítulo do livro, e o leitor é levado até o seu velório. Logo no início, já fica claro que os funcionários públicos do sistema judiciário russo estarão na mira de Tolstói durante toda a novela. Eles são apresentados como pessoas indiferentes e insensíveis, que estão menos preocupados com o falecimento do colega, do que com a oportunidade de preencherem a vaga de juiz que surgiu com a morte dele.
A partir do segundo capítulo, descobrimos como foi a vida de Ivan Ilitch. Nas palavras do narrador:
A história pregressa da vida de Ivan Ilitch foi das mais simples e comuns e, ao mesmo tempo, das mais terríveis.
Desde a juventude, o protagonista – nascido numa família de funcionários públicos – levou uma vida bem… burocrática. Ivan Ilitch era competente e cresceu bastante dentro do funcionalismo, mas nunca foi diferente de seus colegas. Todas as suas decisões, inclusive o casamento, foram tomadas pra que a sociedade russa visse que havia decência (palavra que é repetida várias vezes no texto) em sua vida.
Tudo correu dentro do planejado, até que um acontecimento tolo deu início às complicações de saúde que o levariam à morte.
Crítica aos médicos russos
A longa agonia de Ivan Ilitch é dolorosa de várias formas. Além da dor física que sente, ele logo percebe que terá que encarar a chegada da morte praticamente sozinho. A relação com sua família fica cada vez mais problemática; ele sente que está se tornando um peso e, ao mesmo tempo, acha que sua esposa e os filhos são incapazes de entender a gravidade da sua situação.
Ivan Ilitch passa por vários médicos, mas nenhum é capaz de curá-lo. Assim como faz com os funcionários públicos, Tolstói critica-os e os retrata como frios e insensíveis às necessidades das pessoas. Os médicos também são retratados como vaidosos, e o narrador os denomina “o famoso”, “a celebridade”, etc.

Sem tom doutrinador
A morte de Ivan Ilitch foi publicada em 1886, no período em que Tolstói passou a renegar seus escritos que não estavam de acordo com suas novas posições filosóficas e espirituais. Entretanto, essa novela não possui um tom doutrinador – e esse foi um dos fatores que mais me fez gostar dela.
Embora o protagonista reveja sua moral durante a agonia, esse processo se dá de forma natural, não parecendo em nenhum momento uma maneira forçada de passar uma mensagem. Também é natural a construção do personagem Guerássim, embora ele seja claramente a representação do modelo de perfeição buscado por Tolstói (Guerássim é um criado humilde, dono de um bom coração e com muita disposição para o trabalho).
Uma experiência e tanto
O livro faz parte da Coleção Leste da Editora 34, e a edição tem textos complementares de dois especialistas em literatura do Leste Europeu: Boris Schnaiderman (que também assina a tradução) e Paulo Rónai.
Seria uma inverdade dizer que A morte de Ivan Ilitch é uma leitura agradável, mas é uma experiência e tanto. Apesar do tema complicado, a novela termina com certa leveza, e a clareza e a elegância do estilo de Tolstói são incomparáveis.
AVALIAÇÃO
→ Fotos: Lucas Furlan, exceto retrato de Tolstói (extraído da internet).
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