Quem já leu Coração assombrado, a biografia de Stephen King, sabe que o autor sempre usou várias de suas fobias como matéria-prima para suas histórias. Por isso, é natural que ele tenha se inspirado em seu medo de aviões para editar, em parceria com Bev Vincent, a antologia de contos Terror a bordo. Entretanto, como um todo, o livro passa longe de ser assustador — o que não quer dizer que a seleção das histórias não seja muito interessante.
Afinal, é impossível que uma coletânea que reúna textos de autores como Ray Bradbury, Roald Dahl, Ambrose Bierce e Arthur Conan Doyle seja ruim. O conto de Doyle, sobre um aviador que descobre monstros que vivem acima das nuvens, foi escrito em 1913 e é deliciosamente ingênuo e imaginativo.
Além do terror
As narrativas são bem variadas e não se restringem apenas ao gênero terror. Há desde ficção científica (como os ótimos Ataque aéreo, de John Varley, e Lúcifer!, de E. C. Tubb) até uma história de investigação (Assassinato nas alturas, de Peter Tremayne). O último texto (Caindo, de James L. Dickey) é um poema.
Dois grandes atrativos de Terror a bordo são os belos contos inéditos de Stephen King e Joe Hill, seu filho, escritos exclusivamente para a antologia. King criou O especialista em turbulência, sobre um homem angustiado com uma profissão inusitada; Hill escreveu Vocês estão liberados, sobre passageiros de avião que descobrem, durante um voo, que uma guerra nuclear teve início. O outro editor, Bev Vincent, também colaborou com uma história inédita, a movimentada, mas previsível, Zumbis a bordo. Stephen King ainda escreveu a ótima introdução e textos curtos de apresentação antes de cada conto.

Na minha opinião, porém, o conto de maior destaque do livro — e, sem dúvida, o mais apavorante — é Pesadelo a vinte mil pés, de Richard Matheson. Durante uma viagem de avião, um passageiro em pânico vê uma criatura monstruosa danificando a asa da aeronave, mas ninguém acredita nele. O conto talvez seja a história de terror situada num avião mais popular de todos os tempos, tendo sido adaptada duas vezes na série Twilight Zone (Além da imaginação), em 1963 e no reboot de 2019. Quando a série foi levada aos cinemas, no filme No limite da realidade, de 1983, o conto criado por Matheson foi novamente adaptado.
A carga, de E. Michael Lewis, que abre a antologia, também causa arrepios e usa como pano de fundo o massacre de Jonestown.
Mas Terror a bordo não é feito só de acertos. Dos dezessete contos, existem uns quatro dos quais realmente não gostei: eles são pretensiosos, excessivamente longos e mal resolvidos. Mesmo sendo minoria, essas histórias comprometem o conjunto.
A antologia de Stephen King e Bev Vincent vale a leitura, mas é importante reafirmar que não é uma obra que vai fazer você morrer de medo (e nem pensar duas vezes da próxima vez que for entrar em um avião). A viagem durante a leitura de Terror a bordo é bem agradável — ainda que aconteçam algumas turbulências no trajeto.

TERROR A BORDO
Autores: Stephen King e Bev Vincent (organização)
Tradução: Regiane Winarski
Editora: Suma
Páginas: 288
Onde comprar: Amazon
*eBook recebido através da parceria com a Companhia das Letras.

Postado por Lucas Furlan
É formado em Comunicação Social e trabalha com criação de conteúdo para a internet. Toca guitarra e adora música e cinema, mas, antes de tudo, é um leitor apaixonado por livros.