Acabou. Depois de oito temporadas, Game of Thrones chegou ao fim no último domingo. O desfecho da série da HBO recebeu muitas críticas, e até uma petição bizarra foi criada exigindo que essa última leva de episódios seja desconsiderada. O último episódio, The iron throne, teve falhas — como a oitava temporada inteira, aliás — mas, de uma forma geral, eu gostei. Sim, eu sei que faço parte da minoria.
Atenção: este texto tem spoilers.
O principal problema da reta final de Game of Thrones foi, sem dúvida, a narrativa acelerada. Com menos episódios, a trama foi apresentada de forma corrida e isso prejudicou o desenvolvimento dos personagens e a coerência em diversas situações.
Muita gente reclamou que Daenerys tenha se revelado uma tirana, embora os sinais sempre tenham estado lá. A questão é que nós nos acostumamos a ver a Mãe dos Dragões como heroína durante anos, e tivemos que aceitar esse lado obscuro dela em apenas três episódios.

Essa pressa comprometeu também a verossimilhança. Em The iron throne, por exemplo, não deu pra entender por que o Verme Cinzento — um carrasco implacável — não executou o Jon Snow quando soube que ele tinha matado sua rainha. Faltou uma cena explicando o porquê de ele ter sido poupado.
Com Tyrion, a mesma coisa. Ele não só não foi executado, como foi autorizado a participar, e ser decisivo, na escolha do próximo rei. Isso seria mais aceitável se tivéssemos visto alguns personagens simpáticos a ele argumentando que Tyrion era o último membro vivo de uma das famílias mais nobres de Westeros e, portanto, deveria participar daquele conselho.
Compare com o desfecho de Podrick. O escudeiro terminou como membro da Guarda Real, o que pode ser visto como um exagero. Mas, além de ele ter sido treinado por Brienne e de ter provado sua lealdade em várias ocasiões, seu aprimoramento no combate foi elogiado por Jaime. Uma única frase dita num episódio anterior torna o acontecimento mais fácil de ser aceito.

Muitas situações do episódio ficaram desleixadas. Não sabemos o que aconteceu aos dothraki; reinos tradicionalmente rebeldes, como as Ilhas de Ferro e Dorne, aceitam a independência do Norte sem solicitar o mesmo privilégio; é escrito um livro (adivinhe o nome: As crônicas de gelo e fogo) narrando tudo que se passou e Tyrion, um dos personagens mais importantes da história recente, não é citado; Bran — que é capaz de ver tudo o que aconteceu e acontece no mundo — solicita a posse de um novo Mestre dos Sussurros para ser informado dos segredos do reino…
Isso tudo incomodou bastante, mas o desfecho dos personagens foi bem satisfatório, pelo menos pra mim.
A gente já esperava que Daenerys fosse morta por Jon Snow, e assim aconteceu. Sua morte foi simples, dada a importância da personagem, e a partir de certo momento se tornou inevitável. Antes de ser apunhalada pelo amante, a khaleesi teve ótimas cenas, principalmente em sua chegada para discursar para seus soldados, quando as asas de Drogon pareceram fazer parte de seu corpo.

O dragão também teve sua despedida. Ao ver que sua mãe estava morta, ele reconheceu o sangue Targaryen de Jon Snow e poupou sua vida, mas destruiu o trono de ferro — um símbolo da glória e da ruína de Daenerys, da Dinastia Targaryen e, consequentemente, de todos os dragões. Drogon recolheu o corpo de sua mãe e desapareceu em direção ao leste.
Sam se torna meistre e Brienne passa a comandar a Guarda Real. No livro de registros da Guarda, ela finaliza a história de Jaime, possibilitando que o Regicida passe a ser visto como um homem honrado no futuro.
Sansa e Arya tiveram desfechos coerentes. Sansa consegue a independência do Norte e se torna a rainha por lá — embora fosse perfeitamente aceitável se ela tivesse sido eleita a rainha de Westeros inteiro. Sansa aprendeu com amigos e inimigos e se tornou uma líder forte e sábia (a “baixada de bola” que ela dá em seu tio, Edmure, é sensacional).

Arya abandona o continente e vai explorar os mares desconhecidos a oeste de Westeros. A gente torcia pra que ela ficasse com sua família mas, assim como sua loba, Nymeria, ela tinha seu próprio rumo a seguir.
Foi uma surpresa Bran ser escolhido como o novo rei, afinal, mesmo com todo o seu poder, o personagem não vinha servindo pra muita coisa já há algum tempo. As funções de Rei e de Corvo de Três Olhos também pareciam incompatíveis. Mas é aceitável (ok, mais ou menos aceitável) se a gente pensar que ele, teoricamente, não vai repetir os erros dos governantes anteriores. Com suas visões, ele tem acesso aos êxitos e fracassos dos reis que o antecederam.
Tryion foi o grande personagem do episódio. Desde o começo, quando ele encontra os corpos de Cersei e Jaime, até o final quando ele reassume o cargo de Mão do Rei. É o anão quem convence Jon Snow a matar Daenerys e quem sugere que Bran seja coroado. Tyrion teve sua importância diminuída por várias temporadas, mas foi a figura mais importante no encerramento da série. De quebra, ainda colocou o mercenário Bronn no pequeno conselho como Mestre da Moeda (o que é meio estranho, mas não deixa de ser engraçado).

E, por fim, Jon Snow. Por mais que muitos espectadores não gostem dele, Jon sempre foi o personagem disposto a se sacrificar e a fazer o certo. Por isso, seu final faz todo o sentido.
Ao matar Daenerys, sua rainha, ele abre mão de sua honra e de sua própria vida (lembremos que Jon só sobreviveu pela boa vontade dos roteiristas; ele poderia ter sido morto por Drogon ou pelo Verme Cinzento). Jon não é executado, mas é enviado de volta à Patrulha da Noite. Tudo bem, a Patrulha não deveria existir mais, mas aquele é o lugar ao qual ele sempre pertenceu. Jon sempre viveu como um bastardo e a descoberta de seu nome real não mudou isso.
Jon volta ao Norte e se une aos Selvagens, que, não por acaso, são autodenominados “o Povo Livre”. O “bastardo de Winterfell” finalmente se sente em casa e próximo de sua verdadeira essência, representada pelo reencontro com o lobo Fantasma. Jon Snow nunca será Aegon Targaryen. Ele, finalmente, pôde virar as costas para Westeros, para as famílias nobres e suas disputas por poder.

A temporada final de Game of Thrones ficou longe de ser perfeita e, sem dúvida, poderia ter sido melhor. Tudo foi muito corrido, várias premissas foram abandonadas pelo caminho e muitas soluções fáceis foram utilizadas.
Talvez eu tenha me apegado demais à série, mas, na minha opinião, esses problemas não foram suficientes para quebrar sua mística. O caminho dos personagens pode ter sido tortuoso, mas seus destinos foram dignos.